Fernando Pessoa (1888-35), escritor portugués tras el que se escondía el heterónimo de Ricardo Reís. |
Ven a sentarte conmigo, Lidia, a la orilla del río.
Con sosiego miremos su curso y aprendamos
que la vida pasa, y no estamos cogidos de la mano.
(Enlacemos las manos.)
Pensemos después, niños adultos, que la vida
pasa y no se queda, nada deja y nunca regresa,
va hacia un mar muy lejano, hacia el pie del Hado,
más lejos que los dioses.
Desenlacemos las manos, que no vale la pena cansarnos.
Ya gocemos, ya no gocemos, pasamos como el río.
Más vale que sepamos pasar silenciosamente
y sin grandes desasosiegos.
Sin amores, ni odios, ni pasiones que levanten la voz,
ni envidias que hagan a los ojos moverse demasiado,
ni cuidados, porque si los tuviese el río también correría,
y siempre acabaría en el mar.
si quisiéramos, cambiar besos y abrazos y caricias,
mas que más vale estar sentados el uno junto al otro
oyendo correr al río y viéndolo.
Cojamos flores, cógelas tú y déjalas
en tu regazo, y que su perfume suavice el momento-
este momento en que sosegadamente no creemos en nada,
paganos inocentes de la
decadencia.
Por lo menos, si yo fuera sombra antes, te acordarás de mí
sin que mi recuerdo te queme o te hiera o te mueva,
porque nunca enlazamos las manos, ni nos besamos
ni fuimos más que niños.
Y si antes que yo llevases el óbolo al barquero sombrío,
nada habré de sufrir cuando de ti me acuerde,
a mi memoria has de ser suave recordándote así- a la orilla
del río,
pagana triste y con flores en el
regazo.
Texto original en portugués
Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira rio
Vem Sentar-te Comigo, Lídia, à Beira do Rio
Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio.
Sossegadamente fitemos o seu curso e aprendamos
Que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas.
(Enlacemos as mãos.)
Depois pensemos, crianças adultas, que a vida
Passa e não fica, nada deixa e nunca regressa,
Vai para um mar muito longe, para ao pé do Fado,
Mais longe que os deuses.
Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos.
Quer gozemos, quer não gozemos, passamos como o rio.
Mais vale saber passar silenciosamente
E sem desassosegos grandes.
Sem amores, nem ódios, nem paixões que levantam a voz,
Nem invejas que dão movimento demais aos olhos,
Nem cuidados, porque se os tivesse o rio sempre correria,
E sempre iria ter ao mar.
Amemo-nos tranquilamente, pensando que podiamos,
Se quiséssemos, trocar beijos e abraços e carícias,
Mas que mais vale estarmos sentados ao pé um do outro
Ouvindo correr o rio e vendo-o.
Colhamos flores, pega tu nelas e deixa-as
No colo, e que o seu perfume suavize o momento —
Este momento em que sossegadamente não cremos em nada,
Pagãos inocentes da decadência.
Ao menos, se for sombra antes, lembrar-te-ás de mim depois
Sem que a minha lembrança te arda ou te fira ou te mova,
Porque nunca enlaçamos as mãos, nem nos beijamos
Nem fomos mais do que crianças.
E se antes do que eu levares o óbolo ao barqueiro sombrio,
Eu nada terei que sofrer ao lembrar-me de ti.
Ser-me-ás suave à memória lembrando-te assim — à beira-rio,
Pagã triste e com flores no regaço.
Ricardo Reis, heterónimo de Fernando Pessoa (1888-1935).